segunda-feira, 26 de julho de 2010

Luzes


Ela fechou a porta de ferro com força, fazendo ecoar um estalido metálico. Seus olhos estavam cheios de lágrimas. Ela jogou suas costas na porta e se apoiou nela com as palmas das mãos. Seus joelhos estavam meio flexionados, ela estava cansada e fraca. Ela chorava. Acabou escorregando e caindo no chão. Pôs seus dedos em meio a seus lábios enquanto soluçava e balançava a cabeça negativamente, apavorada. Sua angústia era tremenda que ela não conseguia pensar. Sua visão estava embaçada e ela soltava alguns gemidos de sofrimento. Seu coração palpitava desordenadamente, forte, porém lento. Ela tremia das mãos aos pés.

Reuniu forças para conseguir levantar. Ela tinha conseguido se controlar um pouco. Não soluçava nem gemia, porém ainda chorava. Seus passos eram vagarosos, ela mantinha as mãos na boca. Uma rajada de vento soprou em seu cabelo, ela pôs uma das mãos à frente como se tentasse se proteger dele. A água em seus olhos foi se dissipando e ela pôde distinguir alguns pontos pequenos de luzes amarelas. O barulho do vento e dos carros, vários metros abaixo dela, na rua, era até tranqüilizador. O cheiro era de fungos e umidade. Ela olhou para o horizonte. Vários prédios emitiam seus pequenos focos de luz. Não havia uma única estrela no céu, nem lua, mas mesmo assim era lindo. Lindo. Ela deu um longo e demorado soluço de choro. Não compreendia como existem coisas lindas no mundo... E que não podem ser aproveitadas.

Deu mais alguns passos vagarosos em direção ao parapeito da laje do prédio. Sentou-se no pequeno muro que separava o lugar onde ela estava do resto do mundo. Olhou para baixo. As luzes vermelhas e amarelas dos carros passavam rapidamente lá na rua. Seus olhos se desfocaram e ela voltou a chorar. Jogou-se no chão e abraçou seus joelhos. Gemia negando algo, sofria de angústia. Dava socos no chão acertando uma poça d’água, não acreditava na vida. Seus olhos estavam vermelhos e inchados. Seus gemidos eram longos e sofridos, como se ela fosse a pessoa mais apavorada do mundo.

Ainda chorando, ela apoiou uma das mãos no parapeito e outra no joelho, e se levantou, vagarosamente. Mais uma vez viu as luzes da cidade, e o vento bateu em seu cabelo. Ela colocou um dos pés na mureta, e depois deu um impulso para subir com o outro. Abriu os braços em forma de cruz. Ela ainda chorava, fazendo mais barulho do que antes. Suas lágrimas já não caíam na laje do prédio, mas sim seguiam uma longa queda até a calçada da fachada. O vento estava desordenado aquele dia. Fez a camisa dela esvoaçar e a tirou o equilíbrio. Em um movimento não calculado, ela conseguiu se reequilibrar. As luzes, os sons e o vento faziam aquele momento perfeito para acabar com todo o seu sofrimento.

domingo, 18 de julho de 2010

O Príncipe na Armadura Reluzente

O jardim do castelo de meus pais é lindo. Ele é cheio de flores de todas as cores, que deixam seu doce perfume no ar. A luz do sol penetra por entre as copas das árvores, aquecendo minha pele. Eu sentada em uma escada de mármore, na passagem que leva do portão da muralha à entrada do castelo. Escutava o vento balançando as árvores e os pássaros assoviando encantadoras melodias. De vez em quando dava para ouvir vozes de súditos discutindo alguma coisa no pátio, e, ao fundo, uma voz grave gritando ordens. E também, o som de... Um cavalo relinchando. Em dias normais, não era para haver cavalos dentro dos muros do castelo. Isso só podia significar uma coisa. O príncipe havia chegado.

Levantei as várias camadas do meu vestido azul e saí correndo o mais rápido que pude – ainda assim a passos curtos – para encontrá-lo. Deparei-me com ele, ainda passando pelo portão da muralha, montado sobre seu cavalo, um Puro Sangue Árabe de cor negra. Ele estava usando uma armadura prateada que reluzia à luz do sol. Por mais que ele usasse elmo e eu não pudesse ver seu rosto, eu sabia que era ele, o meu príncipe encantado. Ele falava com um soldado do portão, até que se voltou a mim. Ao me perceber, ficou estático. Então ele levou as mãos à cabeça, retirou o elmo e balançou seus longos cabelos loiros ao vento. Ele estava mais lindo do que nunca. Seu queixo fino, seu rosto triangular, seus olhos profundos e seu nariz delicado, todos seus traços de bebê continuavam explícitos depois de anos.

Ele levantou a mão direita para mim e disse:
-Saudações, princesa. Cada vez que te vejo, está mais bela do que antes. Se não for incômodo agora, eu gostaria de dar uma volta pelo reino contigo.
-Mas agora, sem avisar mamãe e papai? – Minhas palavras com que ele recuasse um pouco.
-Se não for incômodo, é lógico – Ele disse, abaixando a cabeça, e seus olhos fixos em mim, me olhando com um sorriso travesso.
-É lógico que eu aceito.
Eu sorri. Não queria dar esse furo com o príncipe da minha vida.
-Que bom.
Então eu peguei sua mão e ele me puxou para a parte de trás do cavalo. Ele colocou o elmo novamente, deu uma meia volta com seu Puro Sangue Árabe, fez um sinal para o guarda e puxou as rédeas.

Fora do castelo, o cavalo corria a máxima velocidade. Eu me segurava na parte estreita da armadura do príncipe, na altura da barriga, para não ser jogada para o lado pelo sacolejo do cavalo. Meu cabelo voava ao vento e meus olhos se cerravam ao serem machucados pelo vento. O príncipe se mantinha ereto sobre o cavalo. Diferente de mim, ele pouco balançava. Passamos por toda a parte rural do reino, as casinhas de pedra e madeira dos plebeus, as grandes plantações coloridas que geravam alimento para toda a população. Chegamos aos limites entre a área habitada e a floresta. Ele continuou conduzindo o cavalo pela estrada de terra entre as árvores do bosque. Acabamos saindo do caminho principal, pegando uma trilha quase imperceptível no meio da vegetação. Ele parou o cavalo em frente a uma casinha de madeira no meio do nada. A clareira onde nos encontrávamos era limpa e cheia de flores. A luz do sol penetrava por entre as copas das altas árvores que nos cercavam. O ar era fresco, era gostoso respirar ali. Não era possível ouvir nenhum som, fora os da natureza: a civilização estava longe.

Ele desceu do cavalo, e depois me ajudou a fazer o mesmo. Estávamos um de frente para o outro quando ele tirou o elmo e pegou em meu queixo, aproximando nossas faces. Ele disse “Eu te amo, te amo muito”, e eu respondi “Eu também”, antes dele pegar em minha nuca e começar a me beijar. Eu também tentei pegar em sua nuca, mas a armadura me atrapalhou. Ele deu alguns passos para trás e desprendeu as cintas que firmavam a armadura, deixando-a cair no chão e mostrando uma cota de malha. Depois, tirou também a cota, revelando um corpo definido, forte, digno de um príncipe dos sonhos.

Ele disse:
-Amo-te demais. Vejo-te todas as noites em meus sonhos. Por muito tempo, fiquei contando os segundos para te ver novamente. Não sei o que faria se não tivesse o teu amor.
Fiquei sem o que responder. Não me vinha à mente nada o que eu pudesse falar. Aproximei-me dele, com o intuído de dar-lhe um beijo. Eu não poderia estragar o clima naquele momento. Mas minha insegurança não me permitiu encostar meus lábios nos dele.

Minha sorte que ele fez isso por mim. Ele me pegou de uma maneira difícil de descrever. Senti-me como se fosse posse dele. Ele levou as mãos nas partes mais sensuais do meu corpo. Ergueu meu vestido. Foi me levando para dentro da pequena casinha. Eu tive uma sensação estranha, mas não podia furar com ele. Ele sabia o que estava fazendo. E nós nos amávamos. Se alguma coisa fosse acontecer lá, já estava na hora.

Enquanto nos beijávamos, ele tirou a parte inferior da armadura, e depois a parte inferior da cota de malha, ficando somente com sua roupa íntima. Eu me deixei cair sobre a cama que havia lá. Ele foi colocando as mãos nas minhas coxas e erguendo meu vestido, até eu me encontrar inteiramente nua, e ele também. E aí rolou.

Eu me sentia nas nuvens. Estava plenamente satisfeita. Meu coração se enchia de amor e de prazer. Ele era tudo para mim. Meu príncipe da armadura reluzente. Minha fortaleza. Meu amor.

Quando tudo estava acabado, e meus pensamentos tinham se organizado novamente, eu estava deitada na cama. Vi a mancha de sangue sobre o lençol. Eu não era mais virgem. Mas pelo menos fiz isso com alguém que, naquela hora, eu tinha certeza que me amava.

Então olhei pela janela e vi o meu príncipe lá fora, já com a armadura vestida.

Ele disse “Meio bobinha, mas deu pro gasto” antes de montar no cavalo e ir embora, me deixando sozinha lá.