Nós saíamos do bar, andávamos na rua, lado a lado.
Passando por de baixo das luzes dos postes. Ouvíamos as músicas animadas
tocando, as pessoas conversando e rindo, um carro passando, um copo quebrando.
Ele estava do meu lado, mas não estávamos de mãos dadas. Eu não gosto de andar
de mãos dadas. O primeiro motivo é porque parece que você está exibindo a outra
pessoa como se ela fosse um troféu. Como se você dissesse “Olha, eu namoro e
você não”. O outro motivo é porque parece uma forma de controle. “Ande do meu
lado, fique só comigo”. Eu não acho legal manter alguém que você gosta numa
gaiola. As pessoas são mais belas quando elas estão livres.
Eu não me lembro do motivo pelo qual nós saíamos do bar.
Era cedo para voltarmos para casa, o metrô ainda não tinha voltado a funcionar.
Eu só sei que eu me sentia bem por ele estar comigo. Não conversávamos tampouco
nos encostávamos, não fazíamos nada além de andar juntos. Tê-lo comigo era o
suficiente para dar um sentido à minha noite.
Sentamos na calçada de uma rua escura, sem saída. Ficamos
de ombros encostados. Eu olhava para o Converse marrom dele. Acendi um cigarro.
Fiz um gesto oferecendo, mas ele gesticulou com a mão negando. Ele sempre
recusa. Fiquei olhando para o rosto dele através da fumaça, ele sorria. É
incrível como eu me sentia bem perto dele, mesmo sem conhecê-lo direito. Nós
nunca conversamos muito, mas tínhamos intimidade por ficarmos juntos. Ele
sempre do meu lado.
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– Você está feliz?
– Feliz é uma
palavra muito forte, eu disse.
Peguei a minha xícara de chá com as duas mãos, deu um
gole que aqueceu minha garganta. Depois a pus de volta sobre a pequena mesa de
madeira que havia entre nós.
Todos nossos colegas estavam em uma festa, comemorando
suas conquistas. Conquistas que nós dois também obtivemos, mas preferimos
comemorar a sós. Ou não comemorar. Aglomerações me dão nojo.
Ele ficou olhando para mim, desanimado, com suas olheiras
que nunca o deixavam. Suas roupas eram largadas, sem cor, sem vida, assim como
as minhas. Todo o nosso redor era sem vida: Um quarto com paredes imundas, que
costumavam ser brancas. Sofás antigos de couro marrom, rasgados e remendados.
Móveis de madeira, quebrados. Tudo isso em meio a uma bagunça de papéis,
garrafas, panelas, louças. Um calendário de 1998 na parede. Era uma casa
abandonada. Mas nós não usamos a chaleira e as xícaras que encontramos lá,
seria anti-higiênico. Trouxemos tudo de nossas casas.
A casa não tinha mais eletricidade; o aposento era
iluminado por uma única janela, cuja cortina estava caída. Também não tinha
abastecimento de água. A única coisa que os antigos donos deixaram para que
pudéssemos usar foi o fogão com um botijão de gás inesgotado.
Fitei a densa neblina lá fora, atrás da janela. A
(semi)solidão me fazia bem. Deixava-me tranquilo, satisfeito, infinito.
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Uma libélula entrou no banheiro. Ficou voando em frente
ao espelho e depois pousou na pia. Mesmo estando parada, continuou movimentando
suas quatro asas de forma lenta e delicada.
Olhei para o corpo dele atrás do vidro. A água caía do
chuveiro sobre seus ombros e escorria por suas pernas. Ele pegou o sabonete e
começou a se esfregar de forma trivial, com oscilações lentas e equilibradas.
Um movimento suave de sua cabeça fez seu olhar singelo encontrar o meu.
O vapor subia do chão e turvava o vidro do box. Fiquei
admirando-o por não mais que um segundo, mas minha impressão era de que passara
a eternidade lá. É incrível a forma como o nada se parece com o infinito.
Eu não me excitava. Eu sequer o amava. Os momentos que
estive com ele foram bons, mas tem uma hora que todas as coisas boas chegam ao
fim. Minto. Não gosto da palavra “acabar”, mas nada é eterno: Tudo muda e nunca
volta a ser o que era antes.
Então vi a libélula entrando no meio dos jatos d’água,
caindo no chão e sendo sugada pelo ralo.
lindo... principalmente a cena da libélula sendo levada pela água.
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